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Fernando dos Reis Tavares

Fernando dos Reis Tavares, Toco
Toco
Data aproximada da primeira prisão
Julho 1968

Fernando dos Reis Tavares, “Toco”, nasceu na Assomada, ilha de Santiago, Cabo Verde, a 13 de Abril de 1940. Marcou-o, criança ainda, a grande crise de 1947/49, “uma fome arrasadora, que ceifou milhares de vidas. (…) Para além da fome e da falta de comida, também não havia assistência médica. Portanto, foram anos de horrores. E quando se é criança aquilo ganha uma dimensão enorme, ver a impotência de todo um povo perante a calamidade.” Adolescente, apercebe-se que “havia aqui uma situação desumana que era preciso combater” e que “o poder colonial em Cabo Verde era incapaz de resolver os nossos males”.
O convívio com portugueses deportados na ilha e alguns emigrantes leva-o a imaginar a possibilidade de uma sociedade diferente, e o aparecimento do PAIGC a “sentir o cheiro da mudança.”
Quando, no final dos anos 50, vai para a Praia frequentar o segundo ano dos liceus, encontra alguns colegas já influenciados por Abílio Duarte e, eventualmente, com ligações ao PAIGC. Assim, ao partir para Portugal, para o serviço militar, em 1961, “estava mais ou menos preparado” para as ideias que veio a encontrar em conversas com outros milicianos, próximos do PCP, ou do MPLA: “Aí, na tropa, é que se deu o meu conhecimento com aquele mundo diferente do meu, daqui de Cabo Verde, de colonizado.” 
Enviado para Angola como furriel miliciano, não lhe foram atribuídas tarefas na unidade, acabando por substituir um professor que se ausentara, ensinando os muitos analfabetos da companhia. 
De volta a Cabo Verde, e depois de um amigo que esperava o levasse de barco a Dakar, para se juntar ao PAIGC, lhe ter dito que era demasiado perigoso, dada a vigilância da PIDE, parte para Portugal e daí para França, onde estabelece contacto por carta com o PAIGC e acaba por ser contactado por Pedro Pires. Mas o PAIGC pede-lhe que regresse a Cabo Verde, “dentro da Operação Esperança, que era recrutar ou aliciar pessoas para a luta armada de libertação nacional”. “Toco” hesita. Mas quando o próprio Cabral lhe explica a necessidade que têm de ter alguém em Santa Catarina para garantir o trabalho do Partido, acaba por aceitar: “Se os outros correm esse risco, eu também corro, eu vou!” 
O regresso dá-se em Fevereiro de 1968. Pouco depois, em Julho, é preso, e permanece  na Cadeia Civil da Praia até Abril de 1970, altura em que é enviado para o Tarrafal: 
“Chegámos da parte da tarde, aí pelas 2/3 horas. A PIDE foi-nos buscar na Cadeia Comarcã da Praia e levou-nos para o Tarrafal, passando pela Assomada. Chegados à porta, mandaram-nos descer com as nossas malas. A polícia recebeu-nos, conduziram-nos até à cela, abriram a porta e meteram-nos lá dentro. Já lá estavam o Lineu Miranda, o Carlos Tavares, o Luís Fonseca e o Jaime Schofield.”
Embora o seu grupo fosse de presos preventivos, o diretor, “Dadinho” Vieira Fontes “deu-nos o tratamento que dava aos condenados. E, para além disso, mandou-nos para cela disciplinar, lá estivemos, salvo erro, três meses.”
A saída da cela disciplinar só se deu após visita do responsável pela organização do processo, “o major Paula”, que “pediu que o levassem a ver os presos” e disse ao diretor: “Este antro é tenebroso, tire-me estes homens daqui, são seres humanos como nós.”
Em Outubro foi transferido para S. Vicente, para ser julgado: “Quando foi do nosso julgamento, conseguimos meter em S. Vicente, como testemunhas, 300 e tal pessoas destas redondezas.” Entre essas pessoas salienta a apresentação voluntária como testemunha de um padre que o conhecia desde criança, o padre Louis Allaz, a quem transmitira uma mensagem de Cabral, dizendo-lhe que “o PAIGC o considerava um homem distinto e de grande valor para Cabo Verde.” 
“O Tribunal agradeceu-lhe o facto de ter ido a S. Vicente fazer uma declaração a nosso favor (…) para que pessoas íntegras não fossem condenadas por crimes que não tinham cometido.”
“Toco” já não voltaria para o Tarrafal. Como José Maria Ferreira Querido e Gil Querido Varela, foi libertado a 9 de Janeiro, “depois de o Tribunal nos ter posto fora por falta de prova.”
Tem uma ideia clara sobre o destino a dar ao Campo:
“Devia ser um Museu da Resistência, na verdadeira aceção da palavra. Devia ser reabilitado e tornado realmente uma atração turística, como os Campos de Dachau, Treblinka e mais outros Campos de extermínio. O nosso foi considerado igual a esses, foram construídos na mesma época. Todas essas estátuas do Infante D. Henrique e outros colonialistas que nós hoje cá temos deviam ser metidas ali dentro, depois de classificadas.”