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Cárceres do império

A fixação de residência e o banimento

A Ditadura foi responsável pela fixação de residência e deportação de milhares de oposicionistas. A “colocação do preso à disposição do Governo” foi especialmente aplicada pela Ditadura Militar.

Na sequência da revolta de 3 e 9 de fevereiro de 1927, essa disposição passou a ser aplicada sistematicamente. Centenas de deportados seguiram em levas consecutivas rumo à Madeira, aos Açores, à Guiné, a Cabo Verde, a S. Tomé e Príncipe, a Angola e a Timor, estimando-se que, só em Angola estariam mais de 4.000 desterrados.

O banimento do território nacional foi outra medida penal excecional adotada, aplicada pela primeira vez no final de 1932.

O regime fascista estabeleceu uma circulação permanente de desterrados do império. Não se pense que eram apenas os naturais da Metrópole a serem desterrados – os naturais das Colónias eram deportados para longe das suas terras, geralmente com imposição de trabalhos forçados. Na Metrópole, encheram-se as cadeias do Aljube, de Caxias, de Peniche. Para a Ilha da Madeira são deportados numerosos opositores à Ditadura e, nos Açores, a Fortaleza de Angra do Heroísmo foi um dos locais de presença continuada de presos.

Em Cabo Verde, diversas ilhas receberam centenas de deportados, sendo aí criado o campo de concentração do Tarrafal, assim como muitos presos rumaram às colónias prisionais da Guiné, de Angola e de Moçambique. Mas Timor foi também um dos destinos frequentes de deportação. Esta medida, sistematizada ao longo dos 48 anos de vida do regime, constituíram uma das suas mais relevantes armas repressivas, levando à morte um número indeterminado de presos políticos e sociais de Portugal e das ex-Colónias.

Nos primeiros anos da Ditadura Militar, os Açores e a Madeira foram usados para a deportação de centenas de presos políticos. Contudo, a partir da Revolta da Madeira, em 1931, passaram a ser considerados menos “seguros” e usados essencialmente como local de confinamento e passagem dos presos e desterrados para as diferentes colónias, designadamente com recurso à fortaleza de São João Baptista, na Ilha Terceira.

PORTUGAL

Cadeia do Aljube, Lisboa

Cadeia do Aljube

Em 1928, a Cadeia do Aljube de Lisboa passou a funcionar como prisão política. Em 1934 integrou o conjunto de estabelecimentos prisionais colocados sob a administração direta da PVDE. Destinava-se em particular aos presos preventivos que, enquanto decorria a instrução do processo, esperavam julgamento ou a transferência para o desterro.

Ainda em 1935 foi colocada uma rede divisória entre os visitantes e os presos no parlatório, impedindo o contacto físico e facilitando a vigilância das visitas, e foram compartimentadas as celas coletivas. Mas foi no início da década de quarenta, provavelmente em 1943, que o regime prisional mais endureceu, com a construção das celas de isolamento, os chamados curros ou gavetas.

Os curros eram minúsculas celas, de um metro de largura por dois de comprimento, cada uma delas fechada por uma porta gradeada, após a qual havia um pequeno espaço e uma outra porta de madeira com um pequeno postigo de 15 por 20cm.

Ao lado dos sanitários, a cela disciplinar – a cela n.º 14. No mesmo andar, a sala 2A, uma cela coletiva pequena e sombria, cuja única janela era igualmente gradeada e tapada por uma rede fina, que dava para o beco atrás do edifício.

A cadeia do Aljube encerrou portas no verão de 1965. As péssimas condições prisionais e os protestos que estas haviam gerado e que tiveram impacto internacional foram a principal razão do seu encerramento.

Depósito de Presos de Caxias, Oeiras

Depósito de Presos de Caxias

O Forte de Caxias foi outro dos estabelecimentos prisionais colocado sob a tutela da PVDE. A funcionar como cárcere desde 1916, já durante a I República servira ocasionalmente para encerrar presos políticos e sociais. O Reduto Sul passou à alçada da polícia política em janeiro de 1935, o Reduto Norte em maio de 1938. O primeiro reservado à população masculina e o segundo às mulheres. A partir de meados dos anos sessenta, os Serviços de Investigação foram progressivamente transferidos para o Reduto Sul, local onde os interrogatórios contínuos começaram a ser realizados em 1971. Os reclusos foram então concentrados no Reduto Norte.

O encerramento do Aljube, em 1965, e a necessidade de transferir para Caxias a população prisional nele encerrada forçou uma intervenção no Reduto Norte no sentido de ampliar a capacidade da prisão. Foram então instaladas novas celas coletivas e de isolamento. Na noite de 26 de abril de 1974 foram libertados os presos políticos que se encontravam em Caxias. Apenas depois de laboriosas negociações entre uma comissão de advogados e a Junta de Salvação Nacional e em resultado da pressão popular.

Fortaleza de São João Baptista, Ilha Terceira, Açores

Cadeias e campos de internamento da polícia política

Em 1934, a PVDE passou a ter competências prisionais, com a criação da Secção de Presos Políticos e Sociais. Passou então a administrar diretamente as cadeias do Aljube de Lisboa e do Porto, o Forte de Caxias e as Fortalezas de Peniche e de São João Baptista (na ilha Terceira, Açores). A partir de outubro de 1936, também o campo de concentração do Tarrafal (na ilha de Santiago, Cabo Verde) ficou sob a sua tutela. A polícia política dispunha ainda de prisões privativas em algumas das suas instalações, como acontecia na sede, em Lisboa, e nas delegações do Porto e de Coimbra.

 

Penitenciária de Lisboa

 

Presídio Militar da Trafaria

Além destes, muitos outros estabelecimentos prisionais e campos de internamento foram utilizados para encarcerar presos políticos e sociais, tanto em território continental, como nas ilhas e nas colónias.

Do mesmo modo, durante toda a ditadura, as esquadras da PSP, os aquartelamentos da GNR ou os calabouços dos Governos Civis serviram recorrentemente como prisões políticas.

 

Forte da Graça, Elvas

Foram igualmente utilizadas cadeias destinadas aos criminosos de delito comum, como a Penitenciária ou Monsanto. E presídios militares como o Forte de Elvas, o Forte de Sacavém, o Presídio Militar de Santarém ou a Casa de Reclusão da Trafaria. E, em dezembro de 1936, foi ainda criada a Companhia Disciplinar de Penamacor, onde seriam incorporados todos os mancebos sobre quem recaíssem suspeitas de professarem ideias contrárias ao regime, no que se incluíam os refratários.

 

Presídio Militar de Santarém

É nestas condições que a ditadura determina condições cada vez mais duras de encarceramento, em especial nos campos de internamento que cria nas colónias, visando não apenas o afastamento dos elementos considerados perigosos, mas também a sua possível eliminação física.

De Cabo Verde a Timor nascem campos de internamento, cujo regime prisional se tornou cada vez mais violento.

Fortaleza de Peniche

A Fortaleza de Peniche

Utilizada como cárcere desde o início do século XX, a Fortaleza de Peniche foi outro dos presídios que passou à administração direta da polícia política em 1934. Considerada uma prisão com alto nível de segurança, para aqui foram enviados muito em especial os condenados a penas maiores e aqueles que cumpriam medidas de segurança. Num canto do forte, mesmo à beira da falésia, situavam-se as celas disciplinares – o redondo ou o segredo –, cubículos húmidos e sem luz, em que os presos eram mantidos a pão e água enquanto durasse o castigo.

Em 1962 entrou em pleno funcionamento a penitenciária de alta segurança que vinha a ser construída há uns anos. Constituída por “três blocos de cimento armado, totalmente isolados entre si e subdivididos em secções independentes por um complexo sistema de portas, grades e gradões”, com capacidade para 159 presos. Melhoraram então as condições de alojamento, aumentando em idêntica proporção a vigilância sobre os presos, o seu isolamento e o rigor disciplinar.

Na madrugada de 27 de abril de 1974 foram libertados os últimos presos políticos que se encontravam em Peniche. António de Spínola, o presidente da Junta de Salvação Nacional quisera negar o direito de liberdade aos “que eram acusados de atos de violência”. Também aqui foi a solidariedade entre os presos, a firme posição dos advogados e pressão popular a impor a sua libertação incondicional.

CABO VERDE

Campo de concentração do Tarrafal, Ilha de Santiago, Cabo Verde

Em Cabo Verde, diversas ilhas receberam centenas de deportados, sendo aí criado o campo de concentração do Tarrafal, assim como muitos presos rumaram às colónias prisionais da Guiné, de Angola e de Moçambique. Mas Timor foi também um dos destinos frequentes de deportação. Esta medida, sistematizada ao longo dos 48 anos de vida do regime, constituíram uma das suas mais relevantes armas repressivas, levando à morte um número indeterminado de presos políticos e sociais de Portugal e das ex-Colónias.

GUINÉ-BISSAU

Cadeia de Bissau, Ilha das Galinhas

Antes mesmo do início da guerra colonial na Guiné, muitos africanos foram detidos e torturados, designadamente em instalações militares e policiais e na Cadeia de Bissau. Uma centena de presos viria a ser deportada, ainda em 1962, para o Tarrafal.

Também a Ilha das Galinhas, no arquipélago dos Bijagós, foi usada como campo de concentração até maio de 1974.

SÃO TOMÉ E PRÍNCIPE

A colónia de São Tomé e Príncipe foi o destino de milhares de africanos obrigados a trabalhos forçados nas roças. Foi igualmente utilizada para deportados políticos.

ANGOLA

Casa de Reclusão de Luanda, Angola

 

Campo de concentração de S. Nicolau, Angola

Colónia do Bié-Capolo, Campo de Porto Alexandre, Fortaleza de S. Pedro da Barra (Luanda), Cadeia de Vila Clotilde, Cadeia de Cacuaco, Campo da Baía dos Tigres, Campo da Foz do Cunene, Campo de Iona, Campo de Missombo (Kuando-Kubango), Campo de Moçâmedes, Campo de S. Nicolau, Campo de Virei, Campo de Ambrizete, Casa de Reclusão Militar (Luanda), Colónia Penal do Bié, Forte de Quibaxe, Vila Nova de Seles

A primeira ação armada dos nacionalistas angolanos teve, precisamente, como objetivo a libertação dos presos políticos que se encontravam na Caseia de S. Paulo, em Luanda.

A violenta reação das autoridades portuguesas e o início da guerra colonial levaram à criação de numerosos campos de concentração em todo o território de Angola, destacando-se os campos de S. Nicolau e de Missombo, por onde passaram milhares de prisioneiros.

Já anteriormente, a colónia de Angola fora frequente destino de deportação de presos políticos e sociais.

MOÇAMBIQUE

Cadeia da Machava, Maputo, Moçambique

Cadeia da Ponta Mahone, Cadeia de Porto Amélia, Cadeia da Beira, Cadeia da Machava, Cadeia de Nampula, Cadeia de Nicoadala, Cadeia de Quelimane, Cadeia de Sommerschild, Cadeia de Tete, Cadeia de Vila Cabral, Campo de Mabalane,Fortaleza do Ibo, Ilha de Xefina, Mabalane, Gaza, Delegação da PIDE em Lourenço Marques («Vila Algarve»)

Tal como nas restantes colónias, também ao longo de todo o território de Moçambique surgiram inúmeras prisões e campos destinados aos «suspeitos» e aos «terroristas».

ÍNDIA

Ao longo da presença portuguesa na Índia, foram criadas diversas instalações prisionais que, em especial após a independência daquele país em 1947, desempenharam um significativo papel de repressão sobre a população indiana, ao mesmo tempo que eram desterrados para Portugal muitos opositores do domínio colonial, não se conhecendo, ainda hoje, a dimensão exata dessa realidade.

TIMOR-LESTE

Cadeia de Aipelo, Timor-Leste

 

Forte de Maubara, Timor-Leste

Maubara, Aipelo, Ataúro, Oekussi-Ambeno

A colónia de Timor foi, desde sempre, um destino de deportação de presos políticos e sociais. Em diversas fases, os presos foram confinados em presídios e campos de concentração criados em diferentes pontos da ilha e obrigados a trabalhos forçados.

Campo de Concentração do Tarrafal, Cabo Verde

O campo de concentração do Tarrafal, na Ilha de Santiago, em Cabo Verde, mandado construir por Salazar por despacho de 8 de outubro de 1935, foi o instrumento mais sinistro da repressão da ditadura. Manuel dos Reis, o diretor do campo, dizia aos presos que chegavam: “Vocês aqui não têm direitos. Só têm deveres a cumprir! E não se iludam: quem entra aquele portão é para morrer! […] Vão todos cair como tordos!”.

Entre 1936 a 1954 estiveram encarcerados no campo de concentração do Tarrafal 357 presos políticos e sociais e nele morreram 32 prisioneiros.

Em 1961 voltou a reabrir portas, por determinação do ministro do Ultramar, agora para receber 227 nacionalistas de Angola, da Guiné-Bissau e de Cabo Verde, tendo 4 deles falecido.

Os últimos presos foram libertados no dia 1.º de maio de 1974.