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Alberto Sanches Semedo

Alberto Sanches Semedo
Data da primeira prisão

Nasceu em 1939 no lugar de Monte Bode, Calheta de São Miguel, na ilha de Santiago, Cabo Verde, e desde muito cedo contestou o regime colonial. Em 1960, vai para a tropa. No ano seguinte, começa a luta armada de libertação em Angola:
“Nessa altura fizeram-nos um tipo de teste de tiro, os que tivessem melhor pontuação iriam para Angola. Do grupo apenas dois conseguiram. Como o número era reduzido, decidiu-se que ninguém iria. Mesmo assim, voltou-se a apelar a gente que quisesse ir para Angola. Eu, como sabia do que se estava a passar, ouvindo falar em Cabral, na luta pela independência de Cabo Verde, eu disse para os meus colegas: "Vocês escutem, ouvi dizer que vocês vão para Angola; vocês não vão só para ganhar dinheiro que estão a dizer que vos vão pagar, vocês também podem ser mortos, porque vocês vão para a guerra". Com isso, eles assustaram-se e desistiram.”
Em 1967, ousa contestar o forte aumento de renda do terreno que seu pai semeava, e é chamado ao administrador do concelho:
“Na altura era Sidónio [de Oliveira Ramos] que me disse: "Tu por que não assinas o contrato?" Eu expliquei-lhe: "O senhor veja: de 390 o contrato passou para 900 escudos, isto é complicado. Se eu não pagar?" "Se não pagar tomamos-lhe o terreno". "Alto lá, entregar o terreno vírgula, porque quando lhe entregar o terreno onde é que vou semear?"
Entretanto começara também a luta armada de libertação na Guiné-Bissau, e Semedo ia ouvindo a Rádio Libertação:
“Em 1970, apareceu o José dos Reis Borges a dizer que tinha sido enviado para recrutar gente para a Guiné. (…) Joaquim Correia, meu primo, contou-me que José estava aqui a recrutar gente para levar para o PAIGC. Eu na altura estava com intenção de emigrar. Quando Djoca me abordou, eu disse logo, "não há problema", até porque eu tinha vontade de conhecer Cabral, pessoalmente. Alinhei.”
Integrou assim o grupo que tentou desviar o “Pérola do Oceano”. Preso no barco a18 de Agosto de 1970, esteve na Cadeia Civil da Praia cerca de seis meses, sendo depois transferido para o Tarrafal:
“Quando entrei na cadeia, no Tarrafal, encontrei Lineu, Jaime, Luís e Carlos. (…)  Logo me familiarizei com os que lá estavam. Por isso, o sentimento de estar na cadeia foi atenuado. Os que lá estavam foram falando connosco, nos inteirando da política de uma forma mais directa porque passámos a privar com gente que sabia mais do que nós. Eu não conhecia o Pedro nem o Eugénio, que também tinha uma noção das coisas, e muito menos os outros (Lineu, Luís…) que, por estarem habituados à prisão, nos ajudaram a integrar naquele ambiente sem muitos problemas.”
O tempo no campo foi aproveitado para estudar:
“O Pedro, como tinha vocação para a arquitetura, estava a estudar o sétimo ano, foi nos ajudando a estudar e nos orientava nos trabalhos de artesanato. Mas, fundamentalmente, como o Pedro e os outros eram os mais habilitados, eles abriram uma "escola" para quem quisesse estudar - Arlindo, Eugénio, Luisinho, Dissanto, que não sabiam nada, aprenderam a ler e a escrever. Eu e o Djoca, que já tínhamos a quarta classe, tomámos "explicação" para o primeiro e o segundo ano. Inclusivamente, já estávamos prontos para fazer exame de segundo ano, o diretor da cadeia não permitiu.”
Libertado a 1 de Maio de 1974, voltou para S. Miguel:
“Como o partido tinha falta de quadros para fazer serviço nesta zona, eu e o Joaquim fomos recrutados imediatamente. (…) Depois, numa certa altura, mandaram-me à União Soviética para uma formação política, voltei em 1978 e quiseram mandar-me para Brava. Aí eu respondi: "Não, mandem alguém mais novo" — eu tinha uns 35 anos. "Além do tempo da prisão, quase quatro anos longe da família, depois cerca de um ano na URSS, acabo de chegar e querem mandar-me para Brava?' Diante disso mandaram um jovem do Maio e me colocaram no Tarrafal- (…) Em 1991, quando houve a mudança política e naquela confusão com os quadros políticos eles acabaram por me nomear quadro do Ministério da Agricultura, no Tarrafal. Em 1995, saiu a lei da reforma antecipada, como eu já tinha tempo (da tropa, o tempo em que estive na cadeia, o tempo de serviço), pedi-lhes a reforma.”
Gostaria que a memória do Campo fosse conservada:
“O Campo devia ficar como um lugar histórico para os nossos filhos, os nossos netos conhecerem, um museu. Para que um dia se possa dizer: "O teu pai passou por aqui". Num museu, com pessoas com um certo conhecimento do edifício, capaz de explicar que por lá passaram portugueses, guineenses, angolanos, cabo-verdianos...”

 

Texto e fotografia a partir de "Tarrafal-Chão Bom, Memórias e verdades", de José Vicente Lopes, a quem agradecemos.