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Maria Lourenço Calção Cabecinha

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Data da primeira prisão

Filha única de operários agrícolas, Maria Lourenço Cabecinha entrou para o Partido Comunista em 1948, quando tinha apenas 15 anos. Em 1952, passou à clandestinidade com o companheiro António Gervásio, vindo a ser presa em 1964, quando este estava, temporariamente, no estrangeiro. 
Permaneceu detida quase cinco anos e meio, regressando à clandestinidade menos de um ano após a sua libertação. Manteve-se assim, mesmo quando, em 1971, o seu companheiro voltou a ser preso.
Operária agrícola, filha de Maria Filipe Calção e de António Joaquim Cabecinha, trabalhadores rurais pobres, Maria Lourenço Calção Cabecinha nasceu em 17 de Março de 1933, na freguesia de S. Romão - Montemor-o-Novo.
Começou a trabalhar fora de casa aos doze anos, sempre de sol a sol, e nunca foi à escola «porque ¬vivia muito longe, tanto da de S. Cristóvão como da de Montemor». As primeiras letras foram aprendidas com a ajuda do pai, «dos poucos camponeses que sabia ler» e muita vontade própria: «depois de largar o trabalho andava uma hora e meia até chegar a casa; e só depois de comer e ajudar a minha mãe, que também trabalhava, na lida da casa, antes de me deitar ia aprender a Cartilha de João de Deus, à luz do candeeiro de petróleo». A instrução primária só seria feita quando saiu da cadeia.
A família já possuía consciência política e, com apenas 15 anos, aderiu ao Partido Comunista: «Por essa altura já comprava e lia o "Avante!". Havia alguém que mo deixava num local já combinado, dentro de uma cabana. Eu ia lá deixar 50 centavos e trazia o jornal para casa. Não ia às reuniões, porque vivia muito isolada. Mas ouvia o meu pai, o meu namorado, o meu futuro cunhado e o meu tio combinarem formas de luta, reivindicações salariais e laborais e ia adquirindo a pouco e pouco consciência política» [in Teresa Fonseca (Coord,), A Memória das Mulheres. Montemor-o-Novo em tempo de ditadura].
Quando o pai foi preso em Outubro de 1949, assim como o tio que vivia em sua casa, teve de passar a tratar sozinha da casa: «Cuidava da minha mãe doente, do meu avô, já com mais de 80 anos, da casa, da horta, da criação e ainda andava a apanhar azeitona. Percorria hora e meia de caminho até chegar ao trabalho. Vivíamos com a reforma de abegão do meu avô, que era de 60$00, e dos 6$50 diários do meu salário».
Em 1952, com 19 anos e um filho de três meses, Maria Lourença Cabecinha passou à clandestinidade juntamente com António Gervásio, o companheiro. O filho ficou com os pais até aos 2 anos e 8 meses, sendo, depois, criado pelos avós maternos e paternos que viviam porta com porta.
Apesar do marido ter estado preso em 1960 e 1961, tendo fugido de Caxias em 4 de Dezembro e, em 1963-1964 ter estado ausente na União Soviética, Maria Lourença Cabecinha manteve-se na clandestinidade, com tarefas de defesa da casa e trabalho técnico: escrever à máquina, policopiar textos no copiógrafo, embalá-los e entregá-los a quem se encarregava da sua distribuição.
Foi presa em 12 de abril de 1964, juntamente com Amélia Maria Estêvão, às nove horas da noite, ao fim de doze anos de clandestinidade. Levada para Caxias, com uma breve passagem pela António Maria Cardoso, nunca prestou quaisquer declarações, nem assinou os autos: não foi espancada, nem sofreu a tortura do sono, mas esteve três meses em regime de isolamento, sem ter uma única visita. Sofreu, sobretudo, tortura psicológica, com inquirições durante a noite a prolongarem-se por horas consecutivas, além de falta de acompanhamento médico e grande discriminação por parte da Direcção da Cadeia, por se ser de origem camponesa, não ter estudos, nem "personalidades" na família.
Julgada em 21 de janeiro de 1965, foi condenada a 2 anos e 10 meses de prisão maior e medida de segurança de internamento indeterminado, de seis meses a três anos, prorrogável. Iniciou o cumprimento da medida de segurança de internamento em 25 de março de 1967, sendo-lhe somente concedida a liberdade condicional em 12 de setembro de 1969 e solta em 18 do mesmo mês.
O «ambiente da cadeia era péssimo», o seu director, Gomes da Silva, mau e cínico e, como no piso onde estava em isolamento funcionavam os serviços clínicos, Maria Lourença ouvia, a qualquer hora do dia ou da noite, os presos «que gritavam por terem sido torturados, pessoas que pediam assistência médica, havia ataques de nervos, de asma, tentativas de suicídio». Em 24 de Outubro de 1968, dia que nunca esquecerá, assistiu, na sala ao lado da sua, à morte do jovem Daniel Joaquim Campos de Sousa Teixeira, ouvindo-se «os seus gritos de aflição e os últimos suspiros».
No depoimento a Rose Nery Nobre de Melo para o livro “Mulheres Portuguesas na Resistência” [Seara Nova, 1975], Maria descreve, ainda, a falta de assistência médica, as rigorosas regras prisionais e a vistoria exaustiva a tudo o que entrava nas salas de Caxias: «os livros eram passados folha a folha, as capas tiradas, as embalagens de "Planta", ou outras, eram golpeadas, os pacotes de açúcar picados, os bolos cortados em bocados, os botões da roupa que eram forrados do mesmo tecido, picados para verem o que tinham dentro, as palmilhas dos sapatos descoladas».
Mas a cadeia também foi um local de aprendizagens: estudou Português e Francês, com Fernanda Paiva Tomás; Matemática e Geografia, com Alda Nogueira; e adquiriu conhecimentos de higiene, saúde, funcionamento do corpo humano e cuidados materno-infantis com a médica Julieta Gandra.
Libertada, regressou, temporariamente, a Montemor, onde permaneceu nove meses junto da família e do filho, tendo o pai falecido durante a sua prisão. Em julho de 1970, reingressou na clandestinidade, voltando a viver com António Gervásio, e aí se manteve até Abril de 1974, apesar de aquele ter sido novamente preso em 31 de Julho de 1971.
Passou o dia 25 de Abril de 1974 a policopiar propaganda do 1.º de Maio na casa clandestina da Damaia: soube que algo se passava através da rádio e de contactos com Sofia Ferreira e o controleiro da zona, só saindo à rua no dia 30, para ir esperar Álvaro Cunhal ao aeroporto. Apenas abandonou aquela casa clandestina no dia 28 de Maio.
Em liberdade, retomou a militância política e partidária de sempre.