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Pundolica Datatria Sinai Gaitondo (Pundlik D. Gaitonde)

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Data da primeira prisão

Pundlik D. Gaitonde (a que a PIDE designa por Pundolica Datatria Sinai Gaitondo), médico cirurgião e activista político, nasceu em Palolem, Goa, a 3 de Julho de 1913 e morreu em Londres a 13 de Novembro de 1992.
Afortunados aqueles que mantiveram contacto próximo com Pundlik Gaitonde, um homem de inúmeros talentos que fundou o Congresso Nacional Goês nos anos 1950 e desempenhou um papel crucial na aceleração da queda do colonialismo português, na qualidade de um dos primeiros promotores de movimentos de libertação que combateram em Angola, Moçambique e Guiné-Bissau, provocando o colapso do regime de Salazar.
Cientista e médico cirurgião de profissão, lutador pela liberdade contra o regime colonial, foi autor de obras sobre história do século XVI e política contemporânea. Gaitonde era conhecido em diversos países e áreas, apesar de muitos não terem senão um vago conhecimento das suas reais qualificações.
Iniciou os seus estudos médicos na Escola Medico-Cirúrgica de Goa, a mais antiga escola de medicina ocidental na Ásia, e especializou-se em cirurgia na Faculdade de Medicina de Lisboa. 
A independência, em 1947, da Índia sob administração britânica foi o facto decisivo para o início do envolvimento de Gaitonde na vida política.
Após o regresso de Lisboa a Goa, onde desempenhou as funções de Cirurgião Chefe do antigo Hospital dos Milagres em Mapuca, Gaitonde veio a ser um dos fundadores do Congresso Nacional Goês, que, tal como o seu congénere indiano, se dedicava ao combate pacífico pela independência. Dada a natureza repressiva do regime colonialista de Salazar, que apresentava as suas colónias ultramarinas como “províncias” de um país unitário e qualquer separatismo nativista como um equivalente de alta traição, o Congresso foi forçado a operar na clandestinidade.
O papel ativo que Gaitonde desenvolveu na luta clandestina pela liberdade de Goa valeu-lhe a prisão pela polícia política PIDE e a deportação para Portugal. Quando terminaram as “medidas de segurança” a que foi sujeito, voltou para a Índia, causando inquietação nas esferas governamentais de Lisboa. 
Pundlik D. Gaitonde daria, aliás, uma conferência de imprensa em Bombaim, em 1955, denunciando também a situação que se vivia em Portugal, citando o caso de Manuel Valadares, obrigado, como muitos outros, a abandonar o país.
Procurou exílio em Nova Delhi, onde trabalhou como Cirurgião Senior no Hospital Irwin, criando e dirigindo a Unidade do Cancro.
Em 1960, foi eleito Presidente do Congresso Nacional Goês e a sua dedicação foi apoiada pelo Primeiro Ministro indiano Jawahrlal Nehru e sua filha Indira Gandhi. Gaitonde, querendo propiciar aos incipientes movimentos de libertação das colónias portuguesas melhores condições, recursos e apoios diplomáticos, empenhou-se em uni-los numa Conferência das Organizações Nacionalistas das Colónias Portuguesas, de que veio a ser Secretário e porta-voz, com o apoio dos líderes africanos exilados que, após a independência, vieram a ser chefes de Estado e de Governo dos respectivos países.
Visitou os Estados Unidos, a União Soviética e outros países e representou a causa de Goa e de outras colónias junto da ONU. A insurreição falhada em Angola, após a brutal repressão no final de 1961, constituiu um factor adicional que apressou a anexação sumária de Goa pela Índia, na sequência da libertação do território em dezembro do mesmo ano. Apesar de esta invasão contradizer a orientação não-violenta de Gaitonde, ele tornou-se o primeiro representante de Goa no Parlamento de Nova Delhi.
Depressa entendeu que os combatentes da liberdade nem sempre dão bons políticos e a atuação dos partidos políticos fizeram-no retomar a sua profissão médica e outras atividades criativas. Com a sua mulher, Edila, natural dos Açores e professora de música, seguiu para Londres em meados da década de 1960, onde terminaria a sua carreira como consultor no Departamento do Cancro do Royal London Hospital, em Whitechapel. A partir de Londres, visitou com frequência a Índia e Portugal e só aos sessenta anos começou a publicar os seus livros.
Significativamente o seu primeiro livro, publicado em 1983, não trata de política, mas de história, designadamente dos pioneiros portugueses na Índia; com destaque, na área da medicina, para um estudo sobre a introdução da ciência ocidental na Índia do século XVI, o qual conclui com uma vasta evidência de que “Portugal e Índia interagiram, influenciando-se mutuamente em diversos campos e nem a história de uma nem a de outro podem ser correctamente escritas sem ter em conta os desenvolvimentos dessa interacção em ambos os países”.
Em 1986, publicou The Liberation of Goa, um estudo de política contemporânea baseado na sua experiência enquanto participante nas lutas anti-coloniais. 
Nos últimos anos, voltou à reforma ativa compilando um compêndio informatizado acerca do tratamento do cancro, destinado a utilização dos médicos dos países em vias desenvolvimento. 
Com a modéstia que argumentava ser baseada no sentido das proporções, costumava dizer que o mais anónimo pode sempre encontrar um território em que seja pioneiro. Mais interessado em produzir do que consumir, Gaitonde era tão avesso à fama que só a sua família e amigos chegados conheciam a verdadeira dimensão das suas faculdades.

Biografia com base na que António Figueiredo escreveu no Independent, de 21 de Dezembro de 1992, publicada por João B. Serra no Grupo Fascismo Nunca Mais (22-10-2017)