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Angolanos no Tarrafal - alguns casos de habeas corpus

Tipologia
Estudos
Autor
Fernando de Abranches Ferrão, Francisco Salgado Zenha, Levy Baptista, Manuel João da Palma Carlos
Data
1974

Providências extraordinárias de habeas corpus requeridas a favor de presos angolanos deportados para o "Campo de Trabalho de Chão Bom" (Tarrafal) e transferência pela PIDE/DGS desses presos para outro campo de concentração no deserto de Moçâmedes, no Sul de Angola

 

Habeas Corpus

A luta no plano jurídico foi, também, uma arma política contra o regime ditatorial que, em Portugal e nas colónias, impôs a violência e a arbitrariedade. E foi, igualmente, expressão de solidariedade de todos os que se bateram pela libertação dos presos.

Em 1971 e 1972, diversos prisioneiros angolanos interpuseram junto do Supremo Tribunal de Justiça providências extraordinárias de habeas corpus com base no facto de ter sido excedido o prazo máximo da prisão sem culpa formada, estando privados de liberdade no campo de concentração do Tarrafal, sem julgamento.

Logo a PIDE/DGS respondeu que aos presos foi tão-só “aplicada a medida administrativa de fixação de residência” ... em Cabo Verde. E o Ministério do Ultramar vai ainda mais longe: afinal, o preso já não está em Cabo Verde pois, entretanto, o ministro do Ultramar “cessou esta medida”, tendo-lhe “fixado residência” ... em Angola.

De tal modo que o Supremo Tribunal de Justiça conclui que “não só aquela medida já cessou”, como, afinal, fixada residência em Angola ... “por virtude de tal, se não encontra detido. E se não se encontra detido, não pode decretar-se a providência requerida.”

A verdade, no entanto, é que aquele mesmo preso, levado do Tarrafal para Caxias e para a cadeia de Setúbal, foi seguidamente internado no campo de concentração de S. Nicolau, em Angola.

Este e diversos outros casos mostram à evidência as artimanhas jurídicas do regime de Salazar e Caetano, que a tudo recorria para impôr a sua tão apregoada legalidade. Mas essas batalhas jurídicas travadas por diversos presos - e que conseguiram, apesar de tudo, alguns resultados constituíram ainda momentos de significativa solidariedade dos advogados que nelas se empenharam, como Francisco Salgado Zenha, Manuel João da Palma Carlos, Fernando Abranches Ferrão ou Levy Baptista. E, enquanto a maioria dos magistrados se prestavam a executar os serviços requeridos pela PIDE, importa também sublinhar que outros afirmaram a coragem de desafiar a polícia política.